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Setembro Amarelo: compreender para prevenir

Setembro Amarelo: compreender para prevenir


A cada setembro, o país volta os olhos para o Setembro Amarelo — mês dedicado à prevenção do suicídio. Mas os dados mais recentes mostram que a campanha chega em um momento de alerta: as taxas de suicídio e as notificações de autolesão no Brasil vêm subindo de forma consistente na última década, com impactos especialmente graves entre jovens e pessoas idosas. Especialistas dizem que é preciso traduzir estatísticas em ação concreta: acolhimento, ampliação do cuidado em saúde mental e políticas públicas que reduzam riscos.

Panorama: números que não podem ser ignorados

Um estudo conduzido pela Fiocruz Bahia, em parceria com outras instituições, analisou dados de 2011 a 2022 e identificou crescimento médio de 3,7% ao ano na taxa de suicídio no país. No mesmo intervalo, as notificações de autolesões e os casos relacionados a tentativa de suicídio também aumentaram de forma expressiva. Esses resultados aparecem em análises técnicas que compilaram notificações, internações e óbitos por autolesão em todo o país.

Entre jovens de 10 a 24 anos os números são ainda mais alarmantes: as taxas de suicídio cresceram em torno de 6% ao ano nessa faixa etária, e as notificações por autolesões subiram cerca de 29% ao ano — sinalizando não apenas mais mortes, mas também mais sofrimento e tentativas registradas. Esses aumentos colocam os jovens como um dos grupos mais vulneráveis no quadro epidemiológico atual.

Além disso, comparações históricas mostram que, entre 2010 e 2019, o número total de suicídios no Brasil saltou — em ordem de grandeza — de cerca de 9.454 para 13.523 casos, um crescimento aproximado de 43% em um período de 9 anos. Esses números ressaltam que o problema não é esporádico nem localizado: trata-se de tendência nacional que exige respostas coordenadas.

Outro grupo em destaque são os idosos: dados estaduais e estudos epidemiológicos apontam taxas mais altas entre quem tem 70 anos ou mais — por exemplo, registros já indicaram médias da ordem de 8,9 óbitos por 100 mil habitantes nessa faixa, acima da média nacional estimada em cerca de 5,5 por 100 mil. A fragilidade social, doenças crônicas, perdas e isolamento são fatores que ajudam a explicar esse risco elevado.

Sinais de alerta — como identificar quem precisa de ajuda

Amigos, familiares e colegas têm papel central na prevenção. Alguns sinais que merecem atenção imediata:

  • Declarações de desesperança ou de que “não vale a pena viver”.
  • Conversas, referências frequentes à morte, ou sugestões sobre autoagressão.
  • Isolamento social e abandono de atividades antes prazerosas.
  • Mudanças bruscas de comportamento: humor muito oscilante, riso deslocado, agitação ou irritabilidade aumentada.
  • Alterações do sono e do apetite (insônia, sonolência excessiva, perda/ganho de peso).
  • Descuido com higiene, aumento no consumo de álcool ou drogas.
  • Preparativos práticos (despedidas, “arrumação de pendências”, doação de bens).

Levar essas manifestações a sério e oferecer presença, escuta e encaminhamento profissional pode salvar vidas.

Mitos e verdades que atrapalham — e como falar sobre o tema

A desinformação alimenta o estigma e atrasa intervenções. Alguns mitos comuns e a realidade:

  • Mito: “Quem quer se matar, se mata mesmo.”
    Realidade: muitas pessoas com ideação suicida buscam escapar de dor intensa — a rede de apoio e tratamento pode interromper a trajetória de risco.
  • Mito: “Uma vez suicida, sempre suicida.”
    Realidade: ideação e comportamento suicida podem retornar em crises, mas com tratamento e suporte muitas pessoas vivem longos períodos sem pensamentos suicidas.
  • Mito: “Falar sobre suicídio incentiva o ato.”
    Realidade: quando a conversa é cuidadosa e sem detalhes de método, falar pode aliviar o isolamento e facilitar busca de ajuda.
  • Mito: “Só pessoas com transtorno mental se suicidam.”
    Realidade: transtornos aumentam o risco, mas causas são multifatoriais — fatores sociais, econômicos, relacionais e eventos traumáticos também pesam.

Qualquer menção ao tema deve ser levada a sério e tratada com empatia, não com rejeição.

O que funciona: estratégias de prevenção

A prevenção eficaz combina ações individuais, comunitárias e políticas públicas:

  • Fortalecer redes de apoio — família, escola, trabalho e comunidade como primeiros pontos de acolhimento.
  • Ampliação do acesso ao cuidado em saúde mental — atenção básica, CAPS, psicoterapia e psiquiatria disponíveis e integradas.
  • Capacitação de profissionais (saúde, educação, assistência social) para identificar sinais e encaminhar.
  • Programas nas escolas — psicoeducação, grupos de escuta e protocolos de intervenção em crise.
  • Redução de acesso a meios letais e políticas que minimizem riscos em ambientes domésticos e públicos.
  • Linhas de atendimento e centros de crise com resposta rápida e acolhedora em situações de risco agudo.

Serviços e números úteis no Brasil

Entre os canais que oferecem acolhimento e atendimento imediato destacam-se:

  • CVV — Centro de Valorização da Vida: apoio emocional gratuito e sigiloso pelo telefone 188 (24h), chat e e-mail. Informação e canais no site do CVV.
  • Samu (192): em situações de risco iminente à vida.
  • Unidades Básicas de Saúde e CAPS: porta de entrada para acompanhamento contínuo no SUS.
  • Hospitais, UPAs e serviços de emergência para atendimento médico e psiquiátrico conforme necessidade.

Fechamento — discurso de responsabilidade

Setembro Amarelo é mais que uma cor: é um convite à ação contínua. Os números recentes mostram que informarmo-nos não basta — é preciso fortalecer redes de cuidado, investir em saúde mental e tratar o tema com sensibilidade jornalística. Se você ou alguém que conhece está em risco, procure ajuda agora: ligar para 188 (CVV) ou para 192 (SAMU) pode ser o primeiro passo para salvar uma vida.

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